Filósofo e
professor
Quem trafega pelas
ruas da cidade percebe todos os dias a imensa desconsideração que motoristas e
motociclistas têm pelos pedestres. Nas
faixas, mesmo nas passagens elevadas ou sob chuva, o pedestre precisa ficar à
espera, até que o fluxo de veículos cesse ou que alguma alma caridosa se decida
a cumprir a lei, correndo ainda o risco de ser atropelado na outra faixa, por
outro motorista que só que saber da
própria pressa.
Mas na semana passada
eu me surpreendi com a gentileza repentina num dos cruzamentos do centro. Até
um motociclista aguardou, solícito, que uma senhora chegasse à faixa para
atravessar. O mistério se desfez logo: havia dois policiais militares postados
na esquina, a poucos metros da referida faixa. Por que o respeito à lei e ao
outro ser humano não podem se manifestar na ausência de uma autoridade, que nos
lembra da sanção pelo erro?
Nosso trânsito
reflete bem como a impunidade cria em nós uma cultura de desrespeito. O mesmo se
passa nos demais setores da vida. Não estou afirmando que todo mundo precisa de
chicote para respeitar a autoridade e seguir as leis. Isso depende muito da
índole de cada um. Mas mesmo os mais propensos à virtude e ao respeito estarão
expostos demais sem autoridade alguma que lhes provoque, de algum modo, algum
tipo de medo e receio. Quanto àqueles que já tendem ao desleixo, nem se fala! Essa
parece ser uma característica da natureza humana. Tenho tentado observar a
relação entre pais e filhos sob essa ótica. Vejo que aquelas famílias que não
abrem mão de uma autoridade segura, e cujos pais não se constrangem por deixar
os filhos com certo medo das consequências do que fazem, conseguem um respeito
muito mais saudável do que os que, em nome do liberalismo e dos novos tempos,
querem o amor dos filhos como prêmio por serem “bonzinhos”.
Estou convencido de
que o respeito se forja, de algum modo, também através do medo. Nas famílias
que trabalham isso com mais maestria, o medo do filho acaba sendo mais de decepcionar os pais, a
quem ele ama e respeita com sinceridade, do que propriamente de receber um
castigo que , de qualquer modo, deve acontecer sempre que necessário. Essa me
parece uma pedagogia valiosa, que, infelizmente, tem sido esquecida. Fruto
desse esquecimento é a falta de respeito que impera em todos os âmbitos da
vida, nas relações familiares e de trabalho, no namoro, na relação com as
autoridades em geral.
Há muitos anos ouço
que, na Europa, basta o pedestre colocar o pé na faixa que os carros param. Será
que é por que eles, naturalmente, têm uma índole melhor que a nossa? Com
certeza não, porque o ser humano é basicamente o mesmo, em qualquer lugar. A
diferença é que lá a multa vem mesmo, as leis existem para serem cumpridas.
Quando o nosso código de trânsito entrou em vigor, o medo da repressão provocou
certa onda de respeito e gentileza, logo substituída pela certeza da
impunidade, porque, na essência, nada tinha mudado, apenas algumas palavras no
papel. Nossa educação precisa evoluir na direção dessa maturidade moral, o que
não acontecerá sem um exercício efetivo da autoridade na aplicação das leis.
Sem isso, os princípios se esvaziarão cada vez mais e essa selva se tornará ainda
mais densa. Respeito é bom e todo mundo gosta!
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